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sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Gabrielli, um presidente fora de lugar

O presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, entrará para a história graças a um feito inédito: fazer com que uma empresa de enorme potencial – com reservas estimadas entre 40 e 80 bilhões de barris só na camada pré-sal e que protagonizou a maior oferta de ações da história, num total de 120 bilhões de reais – virasse alvo da desconfiança do mercado.

Estudo inédito da consultoria Economática aponta que, nos últimos doze meses, a ação ordinária (ON) da empresa foi a única do mercado, entre 340 companhias de capital aberto, a mostrar rentabilidade menor que a do próprio índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Ibovespa). A preferencial (PN) foi a segunda pior do ranking, ao conseguir ganhar do Ibovespa em apenas um único mês, novembro do ano passado. Outra informação interessante: no acumulado de 2010 até 8 de outubro, o valor de mercado da Petrobras encolheu 27,58%. É mais que a depreciação das ações da BP (26,26%), que passou pelo vexame de estar à frente do pior vazamento de petróleo já visto no mundo.

O que essas informações demonstram é que as desconfianças dos investidores são bem maiores e antigas que as discutidas nas últimas semanas – quando o rebaixamentos de perspectivas para a companhia por parte de analistas de bancos fizeram com que os papéis amargassem dias seguidos de queda na bolsa.

Parte do desconforto do mercado deve-se às incertezas técnicas inerentes à exploração do pré-sal e aos desafios financeiros de uma empresa que por em prática um plano de investimentos bilionário.

O maior temor, no entanto, é com o aumento da ingerência do governo numa empresa de capital misto – ou seja, que não tem suas ações apenas nas mãos do estado. Os principais gestores da Petrobras foram indicados pelos dois principais partidos da base governista, como mostra o quadro abaixo. Não haveria problema se suas decisões fossem pautadas apenas pela busca da eficiência e da rentabilidade. Mas o CEO da Petrobras parece ter se especializado em oferecer ao mercado sinais de que a empresa que comanda não é mais que uma ferramenta nas mãos do Palácio do Planalto.

Recentemente, Gabrielli deu munição, junto com o presidente da ANP, Haroldo Lima, a um “debate” público sobre o valor do barril que participaria da capitalização. O assunto era estritamente técnico, confidencial e entregue a certificadoras internacionais independentes, mas ganhou contornos políticos nas páginas dos jornais. Em outro episódio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou à imprensa que fez Gabrielli ‘mudar de idéia sobre a necessidade’ de construir novas refinarias – em outras palavras, “convenceu” uma empresa que já investe muito mais do que gera caixa a prosseguir num caminho perigoso de gastança.

Gabrielli, antes de assumir o cargo de diretor financeiro e de Relações com Investidores da Petrobras em 2003, era professor titular licenciado da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Seu foco de estudo eram os incentivos fiscais e o desenvolvimento regional – nada a ver com a indústria de petróleo. Só em 2005, foi escolhido pelo presidente Lula para presidir a empresa. O fato de o governo ter entregue um posto tão estratégico a um profissional ‘de fora’ do setor já passou a ser visto pelo mercado como sinal de perda de qualidade na gestão da empresa.

O alinhamento ideológico e político ficou ainda mais escancarado nesta semana, quando Gabrielli atacou o governo que antecedeu o de Lula lançando mão de argumentos falsos. Ao contrário do que apregoou Gabrielli, os analistas de mercado são unânimes em afirmar que o salto expressivo na produção da Petrobras coincidiu, no governo FHC, com a aprovação da Lei do Petróleo de 1997 – um divisor de águas que pôs fim ao monopólio e instituiu a concorrência no setor de exploração. Mesmo os estudos sobre a camada pré-sal, afirmam os especialistas, tiveram enorme contribuição não só de Fernando Henrique Cardoso, mas também do ex-presidente Itamar Franco.

Numa análise sobre o papel institucional dos dirigentes de empresas, Gilberto Mifano, presidente do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa, explica que o discurso político deveria, sempre, ser descartado. “O dirigente de uma empresa, quando fala em nome dela, têm de tratar de assuntos relevantes e que tenham ligação com a gestão, o desempenho operacional e os interesses dos acionistas. Declarações políticas não se encaixam neste perfil.”

Hoje, as ações da Petrobras mostraram recuperação. As ordinárias subiram 1,74%, ao passo que preferenciais registraram alta de 2,83%. Mais transparência e mais foco na gestão dos negócios, e menos política, poderiam acelerar esse processo – uma boa notícia para os acionistas e para o país.

Fonte: Veja

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